Você já refletiu sobre o quanto pode ser desafiador estar aberto ao novo quando já temos um conhecimento profundo sobre certo assunto?
Otto Scharmer, criador da Teoria U, considera a escuta como uma habilidade imprescindível para qualquer pessoa em cargo de liderança. Ele nos apresenta quatro tipos, cada um deles representando um degrau da escala da escuta ativa:
– escuta por hábito: refere-se à quando nos comportamos de forma passiva e automática, não permitindo que aquela conversa nos transforme de forma alguma.
– escuta dos fatos: o segundo nível de escuta está relacionado à quando prestamos um pouco mais de atenção e abrimos nossa mente, nos disponibilizando a aprender coisas novas.
– escuta empática: é o nível em que escutamos com o coração aberto e criamos uma conexão emocional com o emissor da mensagem.
– escuta generativa: o último degrau é aquele em que escutamos de forma ativa, com vontade de se engajar na conversa e nas possibilidades que ela traz.
Apesar do desejo que todos temos de atingir o último nível, a escuta generativa, a verdade é que geralmente nós transitamos entre cada um deles em nosso dia a dia, de acordo com as situações que enfrentamos e os desafios que elas nos proporcionam.
Foi assim que percebi uma circunstância especialmente desafiadora, que é praticar e ampliar nossa escuta ativa quando já temos um conhecimento profundo sobre aquilo que está sendo abordado. Nesse contexto, o nosso conhecimento prévio pode fazer com que a gente se sinta seguro demais em relação àquele tema e tire conclusões precipitadas a seu respeito.
Quando isso acontece, a gente deixa de fazer as pausas necessárias para refletir sobre o que está de fato acontecendo e, principalmente, deixa de ouvir verdadeiramente as pessoas. Isso prejudica o nosso entendimento e gera desgastes nos relacionamentos. Ou seja, a gente volta para a escuta por hábito, deixando de permitir que aquela conversa nos enriqueça e nos transforme.
Por vezes, esse comportamento pode até ser uma influência do Crítico, que é o principal Sabotador descrito por Shirzad Chamine. Esse Sabotador é o responsável pela voz interna que acredita na existência do superior e inferior. Ele pode nos levar a crer que nosso conhecimento é superior ao das outras pessoas, por isso não precisamos realmente prestar atenção no que elas têm a dizer.
O artigo “Are You Really Listening?” também traz um ponto de vista muito interessante, de que muitas pessoas em cargos executivos podem ser isolar em uma bolha de informação, o que faz com que não precisem exercitar sua escuta ativa e caiam na escuta por hábito, mesmo que sejam líderes com alto grau de conhecimento.
Um dos trechos do artigo diz que “A arte da escuta tem dois componentes principais. Um envolve ouvir sem distrações ou julgamentos, simplesmente pela compreensão. O outro envolve criar sistemas e processos que não apenas tornam a escuta ativa, mas também a elevam para um estado de hipervigilância.” Esse estado de “hipervigilância” é o que permite um foco não apenas na outra pessoa, mas também em todo o sistema em que se opera.
É natural pensarmos que temos que ter sempre uma escuta generativa, a mais “evoluída” possível, mas a verdade é que vamos oscilar entre esses níveis de acordo com os diferentes contextos. O mais importante é termos consciência do nível em que estamos transitando. Pelo simples fato de que ter consciência nos permite fazer escolhas, ao invés de seguirmos no piloto automático.
Convido você a refletir sobre a sua escuta, sem julgamentos ou críticas, apenas observando: você consegue abrir sua mente, seu coração e sua vontade, mesmo quando você é a pessoa com o maior cargo na sala? Você percebe um contexto por inteiro, como ele realmente é, ou fica preso ao seu conhecimento prévio, sem se abrir para o novo?
A escuta ativa é um exercício diário. O agir com consciência e discernimento, fazendo pausas para analisar a situação como um todo, é uma ferramenta que acredito ser essencial nesse processo e na construção da escuta generativa como uma soft skill.